21.7.10

Sem fim

Da janela do ônibus, quando podia se sentar e encostar a cabeça no vidro naquelas tardes de verão e chuva, olhava o vidro molhado e embaçado pelo bafo úmido das dezenas de pessoas que também voltavam do trabalho. Lá fora o tempo parecia mais lento. Era como se tudo que se passasse na rua, não importasse. Era tudo encenação. Importava encostar naquele vidro e descansar o corpo.

O cheiro de perfume da Avon inundava suas narinas. Uma senhora de cinqüenta e muitos anos, sentada ao seu lado, cheirava a baile da saudade. Não que fosse desagradável. Lembrava-o da sua avó e isso só aumentava o conforto de estar protegido da chuva dentro do ônibus.

Cochilou colado ao vidro.

Acordou poucos metros antes do ponto onde deveria descer para chegar em casa. Foi o tempo necessário para dar o sinal e atravessar a massa humana até a porta. No caminho, pisou no pé de um homem, derrubou uma bolsa e empurrou uma senhora de idade. Mas não podia perder o ponto. Ainda chovia.

Não correu na chuva. Encolheu-se dentro do casaco de nylon e andou decidido pela ladeira. Aos poucos a chuva apertava e rompia a barreira do tecido sintético, umedecendo sua camisa. O tênis já estava ensopado quando chegou em casa. Ficou descalço na porta, largou ali também as calças, o casaco e foi direto ao chuveiro.

Nenhum comentário: